terça-feira, 17 de março de 2009

Amor de areia

Estou aqui, ainda que, apenas de passagem,

passo ao largo, onde as águas são Desejos,

aqui, onde o teu corpo, é apenas miragem

e os meus deleites... são apenas ensejos!

...Ensejos tocados pelas tuas fragrâncias,

delicias sedutoras da tua ousadia doce!...

É aqui, ao largo, onde afogo minhas ânsias,

ânsias de que tudo o que é, ...nada fosse!

...Sei que jamais serei imenso Oceano,

por quem a Praia anseia ser beijada,

serei simplesmente tudo, não sendo nada,

Amor de areia, que o Mar leva num instante!

....Sou apenas, um simples riacho refrescante,

quiça, as Lágrimas do teu contentamento!!

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

Piano

Dizem que a tua alma é de aço, e realmente é,
Nem por isso sua singeleza é comprometida.
Mas quando queres ser enérgico, agressivo ou mesmo explosivo,
Posso sentir o tremor do teu impero a distancia.
Teu corpo negro e robusto me faz indagar,
Como podes ser tão rude na aparência,
E sussurrar melodias tão doces ao ponto do pranto me levar?
Sentar-se a seu lado é privilégio para poucos, merece respeito,
Só os melhores e mais estudiosos tem esse prazer.
Eu poderia ficar horas só a te observar,
Mas prefiro extrair de ti o que tens de melhor.
Ah! Como é bom poder tocar teu corpo,
Sentir tuas vibrações em minhas mãos,
Perceber o belíssimo timbre da tua voz massagear meus ouvidos.
Oh! Me faz sonhar! Fazei-me viajar,
Leva-me a outros mundos através das obras dos mestres,
Aqueles mesmos mestres que renderam-se ao teu poder,
O poder de encantar e gracejar a todos,
Todos que de ouvidos abertos deixaram tua musica penetrar.
Homens como Chopin dedicaram suas vidas a você,
Mas eu sou apenas um aprendiz, um admirador,
O que posso fazer, é juntar-me a ti
Para que vós, através da tua magnitude
Embeleze minhas humildes inspirações,
Transformando-as em belas canções,
Para que o meu amor possa ouvir.

quinta-feira, 13 de novembro de 2008

O Tumitinha e o pé de cachimbo


Como diria o advogado da Suzane von Richthofen, a vida é cheia de mal entendidos. E começa desde cedo. Eu, por exemplo, sempre achei que os cachimbos nasciam em árvores. Não todos, mas pelo menos aqueles cachimbos que os índios usavam em suas cerimônias rituais. Sabe quando os índios chamavam o mocinho do filme para dentro de uma tenda e lá eles fumavam o cachimbo da paz? Então, eu achava que aqueles cachimbos eram uma espécie de fruta, semente ou algo assim. E o porquê dessa minha confusão? Porque eu sempre ouvia aquela historinha “hoje é domingo, pé de cachimbo, o cachimbo é de barro, que bate no jarro”. Entendeu? Eu achava que existia um “pé de cachimbo”, assim como existiam os pés de laranja-lima. Só há alguns meses é que eu me dei conta de que não existia “pé de cachimbo” patavina nenhuma. O que existiam eram os domingos preguiçosos, que “pediam” um cachimbo para relaxar um pouco das agruras da semana. A droga da historinha dizia “hoje é domingo, PEDE cachimbo” e não “PÉ DE cachimbo”. E se você acha que é só comigo que acontecem essas coisas, está muito enganado. Outro dia desses mesmo, uma amiga veio toda triste falar comigo. Era que ela tinha descoberto que o Tumitinha não existia.

- Mas que Tumitinha?

- O Tumitinha. Eu sempre pensava nele como um japonesinho de quem ninguém gostava. O pai dele mesmo, o senhor Tomita, era uma daqueles japoneses bravos, uma espécie de samurai.

- Mas do que é que você está falando?

- Do Tumitinha. Então, um dia, o Tumitinha se apaixonou por uma garota e deu pra ela um anel de presente. Mas o anel se quebrou e a garotinha brigou com o Tuminha só por causa disso, e deixou o Tumitinha sozinho, sem amor nenhum. Entendeu?

- Não entendi é nada.

- Aquela música, “Ciranda Cirandinha”, sabe?

- Sei.

- Então, sabe aquela segunda parte? A do anel?

- Hum... “O anel que tu me deste...”

- Isso, isso! Então, eu sempre cantava essa parte da música assim: “O anel que tu me deste era vidro e se quebrou, o amor do Tumitinha era pouco e se acabou”. E eu ficava com um dó do Tumitinha, coitado, o pai não gostava dele, a namorada não gostava dele...

- Mas não tem Tumitinha nenhum! É “o amor que TU me tinha”!

- Pois é isso mesmo que eu estou falando. Descobri hoje. Coitado do Tumitinha. Além de ninguém gostar dele, ainda por cima ele nem existia. Não é mesmo de deixar a gente arrasada?


Arthur Carvalho...shahsu..ilário!

segunda-feira, 10 de novembro de 2008

Que a saudade não desvanece...


"Tudo o que se sobressai da utopia que advogo
Não é mais do que um substrato do tempo que vivi,
Como a lágrima vertida na atmosfera onde vogo
Não é mais do que um piano pungente que tange por ti…

E as mãos que, na solidão, se intimidam,
Que se desertificam aquando o tempo evanesce
Não são mais do que as palavras nunca antes ditas
E veladas num âmago isolado que entorpece…

Por isso, vem… que a saudade não desvanece…
Vem… que o tempo permanece…
E prende-me em ti…

Tudo o que se ocultava no silêncio temível
Não era mais do que a soturna certeza
Que teimava em calcular pela matemática falível
Nos teoremas esotéricos da imensurável natureza.

E se, novamente, me vires assim, imerso no pensamento,
Pensa que emergi do livro do cepticismo filosófico
Escrito pelas mãos da poesia na candura do tempo
E do exagero desenfreado de um amor platónico.

Por isso, vem… que a saudade não desvanece…
Vem… que o tempo permanece…
E prende-me em ti…"

João Garcia Barreto

Qualquer coisa...

"Começa a haver meia-noite, e a haver sossego,
Por toda a parte das coisas sobrepostas,
Os andares vários da acumulação da vida...
Calaram o piano no terceiro andar...
Não oiço já passos no segundo andar...
No rés-do-chão o rádio está em silêncio...
Vai tudo dormir...
Fico sozinho com o universo inteiro.
Não quero ir à janela:
Se eu olhar, que de estrelas!
Que grandes silêncios maiores há no alto!
Que céu anticitadino! — Antes, recluso,
Num desejo de não ser recluso,
Escuto ansiosamente os ruídos da rua...
Um automóvel — demasiado rápido! —
Os duplos passos em conversa falam-me...
O som de um portão que se fecha brusco dói-me...
Vai tudo dormir...
Só eu velo, sonolentamente escutando,
Esperando
Qualquer coisa antes que durma...
Qualquer coisa."


Álvaro de Campos

terça-feira, 4 de novembro de 2008

Se sinto de mais ou de menos


"Não sei sentir, não sei ser humano, não sei conviver de dentro da alma triste, com os homens, meus irmãos na terra. Não sei ser útil, mesmo sentindo ser prático, quotidiano, nítido. Vi todas as coisas e maravilhei-me de tudo. Mas tudo ou sobrou ou foi pouco, não sei qual, e eu sofri. Eu vivi todas as emoções, todos os pensamentos, todos os gestos. E fiquei triste como se tivesse querido vivê-los e não conseguisse. Amei e odiei como toda gente. Mas para toda gente isso foi normal e instintivo. Para mim sempre foi a excepção, o choque, a válvula, o espasmo. Não sei se a vida é pouca ou demais para mim. Não sei se sinto demais ou de menos. Seja como for a vida, de tão interessante que é a todos os momentos, a vida chega a doer, a enjoar, a cortar, a roçar, a ranger, a dar vontade de dar pulos, de ficar no chão, de sair para fora de todas as casas, de todas as lógicas, de todas as sacadas e ir ser sevalgem entre árvores e esquecimentos."

Álvaro de campos


"estou escondido na cor amarga do fim da tarde. sou castanho e verde no campo onde um pássaro caiu. sinto a terra e orgulho por ter enlouquecido. produzo o corpo por dentro e sou igual ao que vejo. suspiro e levanto vento nas folhas e frio e eco. peço às nuvens para crescer. passe o sol por cima dos meus olhos no momento em que o outono segue à roda do meu tronco e, assim que me sinta queimado, leve-me o sol as cores e reste apenas o odor intenso e o suave jeito dos ninhos ao relento"

Valter Hugo Mãe